Marquesa de Alorna – “Esperanças”
10.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
Leonor de Almeida Portugal de Lorena e Lencastre (Lisboa, 31 de outubro de 1750 — Benfica, 11 de outubro de 1839) foi uma nobre e poetisa portuguesa. Conhecida como "Alcipe".
10.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
Esperanças de um vão contentamento,
por meu mal tantos anos conservadas,
é tempo de perder-vos, já que ousadas
abusastes de um longo sofrimento.
Fugi; cá ficará meu pensamento
meditando nas horas malogradas,
e das tristes, presentes e passadas,
farei para as futuras argumento.
Já não me iludirá um doce engano,
que trocarei ligeiras fantasias
em pesadas razões do desengano.
E tu, sacra Virtude, que anuncias,
a quem te logra, o gosto soberano,
vem dominar o resto dos meus dias.
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10.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
Sozinha no bosque
com meus pensamentos.
calei as saudades,
fiz trégua aos tormentos.
Olhei para a Lua,
que as sombras rasgava,
nas trémulas águas
seus raios soltava.
Naquela torrente
que vai despedida,
encontro, assustada,
a imagem da vida.
Do peito, em que as dores
já iam cessar,
revoa a tristeza,
e torno a pensar.
Como está sereno o céu,
como sobe mansamente
a Lua resplandecente
e esclarece este jardim!
Os ventos adormeceram;
das frescas águas do rio
interrompe o murmúrio
de longe o som de um clarim.
Acordam minhas ideias,
que abrangem a Natureza;
e esta nocturna beleza
vem meu estro incendiar.
Mas, se à lira lanço a mão,
apagadas esperanças
me apontam cruéis lembranças,
e choro em vez de cantar.
Eu cantarei um dia da tristeza
por uns termos tão ternos e saudosos,
que deixem aos alegres invejosos
de chorarem o mal que lhes não pesa.
Abrandarei das penhas a dureza,
exalando suspiros tão queixosos,
que jamais os rochedos cavernosos
os repitam da mesma natureza.
Serras, penhascos, troncos, arvoredos,
ave, ponte, montanha, flor, corrente,
comigo hão-de chorar de amor enredos.
Mas ah! que adoro uma alma que não sente!
Guarda, Amor, os teus pérfidos segredos,
que eu derramo os meus ais inultimente.
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10.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
Aquele outeiro sombrio
está de névoas coberto;
escorre entre canas, perto,
fraco e murmurando, um rio.
Naquele negro pinhal,
como tocha funeral,
brilha modesta candeia,
que ao pastor pobre alumeia
com a luz embaciada.
Vem por corvos arrastada
a Tarde.
A luz apenas das estrelas arde!…
Que pavor
espalha em todo o campo a minha dor!…
Das frestas dos edifícios
vergonhoso mocho voa,
e com seus uivos atroa
os Génios dos malefícios;
saem Fadas peregrinas
a dançar sobre ruínas,
e vêm por entre perigos
gnomos, trasgos, inimigos.
Alumeia
o pirilampo incerto esta coreia.
Que pavor
espalha em todo o campo a minha dor!…
Estão todas apagadas
as luzes da Outra-Banda;
pelas praças ninguém anda,
vagam as sombras caladas.
Naquele triste convento
dobra o sino sonolento;
o ar cos sons esmorece.
O horizonte empalidece:
o vapor autumnal
cobre-o de um véu fatal,
sombrio.
Suspira o vento e nasce o calafrio
Que pavor
espalha em todo o campo a minha dor!…
(…)
Com teu clarão moderado
que objecto me estás mostrando,
que me estás afigurando,
crepúsculo descorado?
Sombra majestosa e cara,
que nas mãos da Parca avara
enches todo o meu sentido!
Es tu, Armínio querido?
Se te retrata a saudade,
apaga as cores a realidade.
Entretanto,
o teu túmulo lava este meu pranto.
Que pavor
espalha em todo o campo a minha dor!…
Sobre o teu marmóreo altar,
onde oculto me magoas,
de plátano cinco c’roas
venho hoje depositar.
Recebe Armínio a mais pura;
duas leve-as a ternura,
de meu pranto comovida,
a Márcia, a Lília querida;
aos dois penhores
dos nossos tristes, doces amores,
condoída,
of’reço duas, of’recera a vida.
Que pavor
espalha em todo o campo a minha dor!…
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