Nota biográfica >>

Eugénio de Andrade, pseudónimo de José Fontinhas (Póvoa de Atalaia, 19 de Janeiro de 1923 — Porto, 13 de Junho de 2005). Apesar do seu enorme prestígio nacional e internacional, Eugénio de Andrade sempre viveu distanciado da chamada vida social, literária ou mundana, tendo o próprio justificado as suas raras aparições públicas com «essa debilidade do coração que é a amizade».

Rosa Alice Branco – “Tarde de Poesia”

05.01.2016

carlos_marreiros

Tarde de Poesia. A Eugénio de Andrade


Estás sentado diante de nós
e o teu corpo soletra o amor
como um deus que não tem memória
e por isso não esquece, nem pode ser menos
do que é. As coisas e o nome que lhes deste
somam uma vida e nada divide ou subtrai
a melodia. Olho para ti com palavras que
tinha perdido e estão todas no teu corpo
a abrir quando estamos pobres e nos dão
ouvidos para a tua voz. A cadeira do tempo
está vazia. Tu preservas até o nome que
foi dado ao ar em que respiraste um amor antigo
ou o último adeus e por isso estás inteiro diante
de nós e é como se pedíssemos que guardes
o que perdemos todos os dias. Na tua voz
as coisas regressam e dói quando a luz
lhes bate nos olhos porque expulsámos a dor
do paraíso. Estás sentado diante de nós
e guardas os afectos que deitámos fora,
distraídos a separar o trigo do joio.

Terça, 15 de Fevereiro de 2000

Poema de Rosa Alice Branco, ilustração de Carlos Marreiros, ambos retirados do livro “Aproximações a Eugénio de Andrade”, editado pela ASA com o patrocínio a BIAL, coordenação de José da Cruz Santos e Direção gráfica de Armando Alves.

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