Baudelaire – “Hino à Beleza”
07.01.2012
Virás do céu profundo ou surges do abismo,
Beleza?! o teu olhar, infernal e divino,
Gera confusamente o crime e o heroísmo,
E podemos, por isso, comparar-te ao vinho.
Conténs no teu olhar o poente e a aurora;
Expandes os teus odores qual noite de trovoada;
Teus beijos são um filtro e uma ânfora, a boca,
Tornando o herói cobarde e a criança arrojada.
Vens da treva mais negra ou descerás dos astros?
Encantado, o Destino é um cão que te segue;
Semeias ao acaso alegrias, desastres,
E por dominares tudo é que nada te interessa.
Caminhas sobre os mortos, que são o teu gozo;
Das tuas joias, o Horror é das que mais fascina,
E entre tais enfeites, o próprio Assassínio
Vai dançando feliz no teu ventre orgulhoso.
O insecto, deslumbrado, procura-te a chama,
Arde, crepita e diz: Benzamos esta luz!
O apaixonado trémulo, aos pés da sua dama,
Parece um moribundo a afagar o sepulcro.
Mas que venhas do céu ou do inferno, que importa,
Beleza! monstro ingénuo, assustador, excessivo!
Se o teu olhar, teus pés, teu riso, abrem a porta
De um Infinito que amo e nunca conheci?
De Satanás ou Deus, que importa?
Anjo ou Sereia, Se tu tornas – ó fada de olhos de veludo,
Ritmo, perfume, luz, ó rainha perfeita!
-Mais leve cada instante e menos feio o mundo?
[Tradução de Fernando Pinto do Amaral]
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