Nota biográfica >>

Rómulo Vasco da Gama de Carvalho (Lisboa, 24 de Novembro de 1906 - Lisboa, 19 de Fevereiro de 1997), português, foi um químico, professor de Físico-Química do ensino secundário no Liceu Pedro Nunes e Liceu Camões, pedagogo, investigador de História da ciência em Portugal, divulgador da ciência, e poeta sob o pseudónimo de António Gedeão. Pedra Filosofal e Lágrima de Preta são dois dos seus mais célebres poemas.

António Gedeão – “Domingo” (sem música)

15.09.2013

“Aos domingos as ruas estão desertas
e parecem mais largas.
Ausentaram-se os homens à procura
de outros novos cansaços que os descansem.
Seu livre arbítrio alegremente os força
a fazerem o mesmo que fizeram
os outros que foram fazer o que eles fazem.
E assim as ruas ficaram mais largas,
o ar mais limpo, o sol mais descoberto.
Ficaram os bêbados com mais espaço para trocarem as pernas
e espetarem o ventre e alargarem os braços
no amplexo de amor que só eles conhecem.
O olhar aberto às largas perspectivas
difunde-se e trespassa
os sucessivos, transparentes planos.
Um cão vadio sem pressas e sem medos
fareja o contentor tombado no passeio.
É domingo.
E aos domingos as árvores crescem na cidade,
e os pássaros, julgando-se no campo, desfazem-se a cantar empoleirados nelas.
Tudo volta ao princípio.
E ao princípio o lixo do contentor cheira ao estrume das vacas
e o asfalto da rua corre sem sobressaltos por entre as pedras
levando consigo a imagem das flores amarelas do tojo,
enquanto o transeunte,
no deslumbramento do encontro inesperado,
eleva a mão e acena
para o passeio fronteiro onde não vai ninguém.”

de, António Gedeão in “Novos Poemas Póstumos”, “Poesia Completa”, pág. 188

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