Comentário de Otília Martel Menina Marota

16.01.2008

Caro Luís Gaspar

Acabei de ouvir emocionada, o Palavras de Ouro 77, dedicado ao Poeta António Ramos Rosa, poeta que ao longo da minha vida aprendi a respeitar e amar.

E reportando-me às palavras de Teresa Sá Couto, que também referes no teu programa, sobre Ramos Rosa:
“Um dos grandes encantamentos da sua poesia está no “olhar original”, inocente, sem uma pré reflexão, com que olha as coisas, o que lhe permite o júbilo constante da descoberta. Esta postura fê-lo aproximar-se da filosofia oriental do Budismo Zen. Dá-nos o exemplo de um momento de alegria quando, um dia, observou “pela primeira vez” uma formiga no seu percurso sobra a folha branca, na qual escrevia.
Outro dos seus grandes ensinamentos é levar a ouvir-nos o que o silêncio, na sua textura secreta, nos pode dizer. Os silêncios falam e podemos ouvi-los na sua linguagem poética.”
É sempre naquele silêncio melodioso, que ouço a forma como consegues imprimir, a cada poema que lês, dando-lhe a interpretação certa, onde num todo se torna Poesia… enchendo-me a alma de significados.
Uma última palavra para dizer-te, como me honra e igualmente emociona, teres escolhido poemas meus, para fazerem parte das Palavras d’Ouro da Truca, enchendo-me de um caloroso orgulho, por me encontrar no meio de verdadeiras Estrelas!
E porque de Poesia falamos, permite-me que te deixe um poema de Ramos Rosa, de que gosto muito:

“O sentido não está em parte alguma.
É como um lábio truncado
ou como a música de um planeta distante.
Raramente é um palácio ou uma planície,
o diamante de um voo ou o coração da chuva.
Por vezes é o zumbido de uma abelha, uma presença pequena
e o dia é fogo sobre a corola do mar.
Ele bebe a violência e a obscuridade
e nas suas margens está o olvido e o caos.
Os seus caprichos contêm toda a distância do silêncio
e todo o fulgor do desejo. Com desesperada música
estala por vezes sob a máscara do tempo.
Com as cinzas de água cria as lâmpadas de sombra
e de um lado é um deserto e do outro uma cascata.
Pode-se percorrê-lo algumas vezes como o espectro solar
ou senti-lo como um grito em farrapos ou uma porta condenada.
Muitas vezes os seus nomes não são nomes
ou são feridas, paredes surdas, finas lâminas,
minúsculas raízes, cães de sombra, ossos de lua.
Todavia, é sempre o amante desejado
que o poeta procura nos seus obscuros redemoinhos.”

(“O Sentido” Poema de António Ramos Rosa in “Acordes”- Antologia Poética, 2001)

Um abraço carinhoso e sempre grata, por merecermos toda a partilha que nos ofereces tão altruistamente

Otília Martel (Menina Marota)

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