Francisco José Tenreiro – “Corpo Moreno”
09.02.2016 | Produção e voz: Luís Gaspar
Francisco José Tenreiro, foi um geógrafo e poeta são-tomense. Foi docente no Instituto de Ciências Sociais e Política Ultramarina, atual Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. (Wikipédia)
09.02.2016 | Produção e voz: Luís Gaspar
Se eu dissesse que o teu corpo moreno
tem o ritmo da cobra preta deslizando
mentia.
Mentia se comparasse o teu rosto fruto
ao das estátuas adormecidas das velhas civilizações de África
de olhos rasgados em sonhos de luar
e boca em segredos de amor.
Como a minha Ilha é o teu corpo mulato
tronco forte que dá
amorosamente ramos, folhas, flores e frutos e há frutos
na geografia de teu corpo.
Teu rosto de fruto
olhos oblíquos de safú
boca fresca de framboesa silvestre
és tu.
És tu minha Ilha e minha Africa
forte e desdenhosa dos que te falam à volta.
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08.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
Noites africanas langorosas,
esbatidas em luares…,
perdidas em mistérios…
Há cantos de tungurúluas pelos ares!…
Noites africanas endoidadas,
onde o barulhento frenesi das batucadas,
põe tremores nas folhas dos cajueiros…
Noites africanas tenebrosas…,
povoadas de fantasmas e de medos,
povoadas das histórias de feiticeiros
que as amas-secas pretas,
contavam aos meninos brancos…
E os meninos brancos cresceram,
e esqueceram
as histórias…
Por isso as noites são tristes…
Endoidadas, tenebrosas, langorosas,
mas tristes… como o rosto gretado,
e sulcado de rugas, das velhas pretas…
como o olhar cansado dos colonos,
como a solidão das terras enormes
mas desabitadas…
É que os meninos brancos…,
esqueceram as histórias,
com que as amas-secas pretas
os adormeciam,
nas longas noites africanas…
Os meninos-brancos… esqueceram!…
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08.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
Pela estrada desce a noite
Mãe-Negra, desce com ela…
Nem buganvílias vermelhas,
nem vestidinhos de folhos,
nem brincadeiras de guizos,
nas suas mãos apertadas.
Só duas lágrimas grossas,
em duas faces cansadas.
Mãe-Negra tem voz de vento,
voz de silêncio batendo
nas folhas do cajueiro…
Tem voz de noite, descendo,
de mansinho, pela estrada…
Que é feito desses meninos
que gostava de embalar?…
Que é feito desses meninos
que ela ajudou a criar?…
Quem ouve agora as histórias
que costumava contar?…
Mãe-Negra não sabe nada…
Mas ai de quem sabe tudo,
como eu sei tudo
Mãe-Negra!…
É que os meninos cresceram,
e esqueceram
as histórias
que costumavas contar…
Muitos partiram pra longe,
quem sabe se hão-de voltar!…
Só tu ficaste esperando,
mãos cruzadas no regaço,
bem quieta bem calada.
É a tua a voz deste vento,
desta saudade descendo,
de mansinho pela estrada…
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