Nota biográfica

Poeta, mas sobretudo conhecido como jornalista. Um extenso trabalho de reportagem jornalística sobre temas ligados à Natureza e ao abuso que fazemos dela.

Afonso Calçada – “Estou vivo”

05.09.2013 | Produção e voz: Luís Gaspar

Fuzilem-me estou vivo
nu das maiores e pequenas vinganças
nu de raiva e de ciúmes
nu de ingratidões
nu de armas
nu de respostas
nu de remorsos
nu de insultos.
Fuzilem-me assim
estou pronto
estou seguro
estou firme
no meu posto.

Já levei os pontapés regulamentares
já ensinei cantigas e obscenidades
já experimentei no corpo
as nódoas roxas que me sobraram da alma
já conheci a lei
e as sanções da lei
e a lei da lei
e a falta de lei da lei.

Estou vivo
não vão é dizer que me matei
não vão é desculpar-se com as hierarquias
as altas a desculparem-se com as baixas
as baixas a desculparem-se com as altas
não vão é dizer que colaborei
que morri camonianamente devagar
de fome e chatice.

Fuzilem-me com pulgas familiares
no refego dos mantos
na bainha das calças
na ponta dos cabelos
fuzilem-me com cuidado
com fúria
com amor
com vontade
sem vontade.

Estou vivo
não vão é dizer que me matei.

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