Mário-Henrique Leiria – “Gin sem tónica “

17.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar

Uma garrafa de gin estava
a preocupar
o pescador
a garoupa e o rodovalho
não tinham aparecido
pró jantar
que fazer?
telefonou ao ministro
da Pesca e do Trabalho
mas o ministro
estava a trabalhar
na cama
com a mulher
foi então
que a garrafa de gin
sugeriu discretamente
porque não
telefonar ao presidente?
telefonaram
o presidente da nação
estava em acção
na cama
com a mulher
nessa altura
até que enfim
encontraram a solução
o pescador
foi para a cama
com a garrafa de gin

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Mário-Henrique Leiria – “Cegarrega para crianças “

17.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar

A Velha dormindo
o rato roendo
a Velha zumbindo
o rato correndo
a Velha rosnando
o rato rapando
a Velha acordando
o rato calando
a Velha em sentido
o rato escondido
a Velha marchando
o rato mirando
a Velha dizendo
o rato escutando
a Velha ordenando
o rato fazendo
a Velha correndo
o rato fugindo
a Velha caindo
o rato parando
a Velha olhando
o rato esperando
a Velha tremendo
o rato avançando
a Velha gritando
o rato comendo

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Mário-Henrique Leiria – “Origem dos sonhos esquecidos”

17.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar

Entre a bicicleta e a laranja
vai a distância de uma camisa branca

Entre o pássaro e a bandeira
vai a distância dum relógio solar

Entre a janela e o canto do lobo
vai a distância dum lago desesperado

Entre mim e a bola de bilhar
vai a distância dum sexo fulgurante

Qualquer pedaço de floresta ou tempestade
pode ser a distância
entre os teus braços fechados em si mesmos
e a noite encontrada para além do grito das panteras
qualquer grito de pantera

pode ser a distância
entre os teus passos
e o caminho em que eles se desfazem lentamente

Qualquer caminho
pode ser a distância
entre tu e eu

Qualquer distância
entre tu e eu
é a única e magnífica existência
do nosso amor que se devora sorrindo

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Mário-Henrique Leiria – “Catavento”

17.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar

o cata-vento
tem obrigações legais
deve
catar o vento
portanto
quando o vento passa
Diz-lhe logo atento
espera aí
preciso de te catar
mas o vento w
sempre a passar
tem outras coisas
em que pensar
não está para ser
catado no ar
e vai passando
desatento
ao cata-vento
sem se importar
com o tristonho
catador de vento
obrigado legalmente
a catar o vento
então
o cata-vento
Senta-se no telhado
aporrinhado
e sem vento
para legalizar
o seu direito
de ser elemento
respeitado
pelos elementos
sentado no telhado
Queixa-se
isto não é vida

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Mário-Henrique Leiria – “Triângulo”

12.01.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar

Eu sei que as túlipas
são os olhos de todos os aviões perdidos

Eu sei que as cidades
são os esqueletos das aves de rapina

Eu sei que os candeeiros ardendo de noite
são os pulmões dos peixes-voadores

Eu sei que o mistério
é uma dentadura abandonada

Eu sei que a loucura
é um braço solitário sorrindo eternamente

Eu sei que os meus olhos
são as tuas pernas frementes

Eu sei que os teus cabelos
são o meu acendedor de pirilampos

Eu sei que a tua boca
é o meu uivo solar

Eu sei que o teu peito e o teu sexo
são a minha água profundamente azul
onde se encontram todos os fantasmas
já perdidos há séculos.

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Palavras 142 – Mário-Henrique Leiria

16.06.2009 | Produção e voz: Luís Gaspar

Vamos ouvir poesia do autor surrealista português, Mário-Henrique Leiria, que nasceu em Lisboa em 1923 e faleceu em Cascais com 57 anos,
Se quiser ler o texto do programa enquanto o ouve, clique AQUI

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038 – Mário-Henrique Leiria e Millôr Fernandes

08.04.2006 | Produção e voz: Luís Gaspar

Sobre este programa, poderá dizer-se que é…variado.
Senão veja-se: um rimance, um conto de Mário-Henrique Leiria e um poema de Millôr Fernandes. O rimance é de todos nós, faz parte da nossa cultura, o texto de Mário-Henrique Leiria foi recolhido de uma edição do romance Contos do Gin-Tonic editado pela Editorial Estampa em 1999.

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