Nota biográfica

Eduardo Hughes Galeano (1940 –2015) foi um jornalista e escritor uruguaio. É autor de mais de quarenta livros, que já foram traduzidos em diversos idiomas. As suas obras dividem-se pela ficção, jornalismo, análise política e História.

“Está envenenada a terra”, poema de Eduardo Galeano.

14.12.2021 | Produção e voz: Luís Gaspar

Está envenenada a terra que nos enterra ou desterra.

Já não há ar, só desar.

Já não há chuva, só chuva ácida.

Vista do crepúsculo no final do século



Já não há parques, só parkings.

Já não há sociedades, só sociedades anónimas.

Empresas em lugar de nações.

Consumidores em lugar de cidadãos.

Aglomerações em lugar de cidades.

Não há pessoas. Só públicos.

Não há visões. Só televisões.

Para elogiar uma flor, diz-se: “parece de plástico”.

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“As pulgas sonham…” de Eduardo Galeano.

30.09.2021 | Produção e voz: Luís Gaspar

As pulgas sonham em comprar um cão, e os
ninguéns com deixar a pobreza, que em algum dia
mágico de sorte chova a boa sorte a cântaros; mas
a boa sorte não chova ontem, nem hoje, nem
amanhã, nem nunca, nem uma chuvinha cai do
céu da boa sorte, por mais que os ninguéns a
chamem e mesmo que a mão esquerda coce, ou
se levantem com o pé direito, ou comecem o ano
mudando de vassoura.



Os ninguéns: os filhos de ninguém, os dono de nada.

Os ninguéns: os nenhuns, correndo soltos, morrendo
a vida, fodidos e mal pagos:

Que não são embora sejam.

Que não falam idiomas, falam dialetos.

Que não praticam religiões, praticam superstições.

Que não fazem arte, fazem artesanato.

Que não são seres humanos, são recursos humanos.

Que não tem cultura, têm folclore.

Que não têm cara, têm braços.

Que não têm nome, têm número.

Que não aparecem na história universal, aparecem
nas páginas policiais da imprensa local.

Os ninguéns, que custam menos do que a bala que os mata.

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Eduardo Galeano – “As guerras mentem”

26.03.2018 | Produção e voz: Luís Gaspar

Não é um poema, mas é como se fosse!
Diz, o escritor Eduardo Galeano:

Nenhuma guerra tem a honestidade de confessar: eu mato para roubar.
 As guerras invocam, sempre, motivos nobres, matam em nome da paz, em nome de Deus, em nome da civilização, em nome do progresso, em nome da democracia e se por via das dúvidas nenhuma dessas mentiras for suficiente, aí estão os grandes meios de comunicação dispostos a inventar novos inimigos imaginários para justificar a conversão do mundo num grande manicómio e um imenso matadouro.
Em Rei Lear, Shakespeare, escreveu que neste mundo os loucos guiam os cegos e quatro séculos mais tarde, os senhores do mundo estão loucamente apaixonados pela morte, que transformaram o mundo num lugar onde a cada minuto morrem de fome ou de doença curável dez crianças e a cada minuto se gastam três milhões de dólares, três milhões de dólares por minuto, na indústria militar que é uma fábrica de morte.
As armas exigem guerras e as guerras exigem armas, e os cinco países que dominam as Nações Unidas, que têm poder de veto nas Nações Unidas, acabam por ser também os cinco principais produtores de armas.
Alguém perguntará, “Até quando?”
Até quando a paz mundial estará nas mãos daqueles que fazem o negócio da guerra? Até quando vamos continuar a acreditar que nascemos para extermínio mútuo? E que o extermínio mútuo é o nosso destino?
Até quando?

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