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A primeira página de grandes obras da literatura.

“Naná” de Émile Zola

11.11.2013

Integrante de um ciclo de vinte romances, “Naná” descreve a trajetória da filha de uma lavadeira que, corrompida na adolescência, transforma-se na mais poderosa cortesã do Segundo Império francês. Escrito em 1880, provavelmente este seja o romance mais popular de Émile Zola, e um dos perfis de mulher mais explorados pelo cinema e pela literatura.

Às nove horas a plateia do Teatro das Variedades estava ainda vazia. Alguns espectadores, no balcão e na orquestra, esperavam, como que tresmalhados por entre as poltronas de veludo vermelho, na branca claridade do lustre a meia-luz. Uma sombra inundava a grande mancha vermelha do pano; e nem um ruído chegava da cena, estando a ribalta às escuras e as estantes dos músicos esbandalhadas. Somente em cima, no galinheiro, em redor da rotunda do tecto onde mulheres e crianças nuas tomavam o seu voo num céu averdungado pelo gás, os chamamentos e os risos sobressaíam por entre um falazar contínuo, e cabeças entoucadas ou embarretadas se mostravam, como que dispostas em degraus, sob as largas clarabóias redondas, de molduras douradas.
Por momentos aparecia uma arrumadora, azafamada, de bilhetes na mão, conduzindo na sua frente um cavalheiro acompanhado de uma senhora, que se sentavam, o homem de casaca, a senhora elegante e esbelta, olhando a sala com lentidão. Na orquestra, apareceram dois jovens. Conservaram-se de pé, observando.
— Não te dizia eu, Heitor — exclamou o mais velho dos dois, um rapagão de bigode negro — que chegávamos muito cedo?… Mais valera que me tivesses deixado acabar o meu charuto.
Passava uma arrumadora.
Oh! senhor Fauchery — disse ela familiarmente. — Isto não vem a principiar antes de meia hora.
Nesse caso, porque anunciam eles para as nove horas? — murmurou o Heitor, cujo rosto magro e comprido tomou uma expressão aborrecida. — Ainda esta manhã, a Clarisse, que entra na peça, me garantiu que principiaria às nove em ponto.
Calaram-se um momento, levantando a cabeça e perscrutando a sombra dos camarotes.

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