Sebastião Penedo – “A noite alentejana”
30.11.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
Sebastião Penedo (Alvito,1945 - Lisboa, 2002). Nasceu em Alvito e estudou nos seminários de Beja e dos Olivais. A guerra colonial levou-o, de onde regressou com problemas. Funcionário público num lugar modestíssimo. Vivia em quartos, gastando o pouco dinheiro em edições de autor. O seu corpo deu à margem do Tejo.
30.11.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
A planície já pôs sua roupagem
nocturna. Agora dorme, sem sentir,
um sono entre acordada e a dormir.
À noite, o Alentejo é a paisagem
dum brando sonho: a lua mira os olho
ao espelho nos pegos das ribeiras.
Há malteses deitados pelas eiras,
além, uma queimada nos restolhos.
Ouvem-se as rãs nos poços coaxar.
Um cão vigia os gados ao relento
e o pastor dorme à porta da cabana.
Cheio de vultos, grilos e luar
e de rumores e de encantamento,
oh, como é grande a noite alentejana!
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30.11.2012 | Produção e voz: Luís Gaspar
Quando nós éramos crianças e morria
alguém amigo ou de família, o avô, lembro,
punham-nos uma tarja preta na manga
verde-axadrezada do bibe mais bonito.
Era o fumo no braço – sinal de finados.
O distintivo, o rótulo para certo tempo de luto,
conforme o grau de parentesco, a proximidade.
Era proibido rir, cantar e assobiar,
como se a morte castrasse o sentimento,
ou as lágrimas da vontade despida de chorar.
Não se sabia que não há luto por um grande amigo.
Não se sabia que a dor pode vestir aliviado,
verde, de todas as cores, vermelho e azul,
e pode, naturalmente, chorando, apetecer cantar.
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